MINÉRIO D'ALMA


Fome de fontes,
águas que, meigas, se me entranhem fundo, límpidas de veludo e me lavem e me levem lentas.
Fome de fábulas,
bosques rumorejantes, faunos, faunas, galhos, folhas, aves que piem, esvoacem, predadores do momento.
Fome de filmes,
cenas a azul, ondulando reais, enquanto mentem.
Fome de fomes médio-diurnas, médio-nocturnas e haver beijos e uns olhos que se olham vivos, luminosos sem nada dizer enquanto falam.

Abranda, meu ser, abranda.
Milhares de imagens e palavras que vejas, que digas, é coisa vã.
Oco é seres exterior e excessivo.
Excede-te no comedimento,
mesmo que não consigas, excede-te em quereres o silêncio e o nulo.
Terramoto, tempestade, febre,
são fúria de passagem: passam. Passem prestes.
Se pudessem não haver, talvez houvesse mais vivos, menos sangue, menos perdas.
Armário funesto é o orgulho, contendo o bolor antigo do esquecimento lembrado,
veneno acre, tóxico.
Bloga, coração! Entre bolor e bulir venha o leitor e escolha.
Leite, mais leite - alimentem-se as pedras, as fragas e penedias mamem.
Mamem o leite da verdade, mane ele, boca a boca, licor, licorne, mito de Prometeu hepático saudável,
agrilhoado,
afogueado furto.
Ó página lenta, escorre por sob a minha mão.
Macia, sacia-me do que diga agora.
Vejo o vinco de uma quilha rompendo verdes águas de veludo, limos,
olho-o, olho-me no vidro líquido onde escrevo suspenso texto:
«Trânsito existir! Trânsito para o Céu certo do depois.»

Queima a minha saudade de Marte: caminhar laranja, monocolor sem respirar aquele pó.
Marte, meu Marte de sonho, onde saltar é mais saltar e caminhar um correr fácil, que céu mel se vê de ti!
Montes, vales, canyons - saudade de ti, deserto vivo, do teu silêncio,
da tua voz recomeço. Ó festa da água descoberta. Ó voos rente a rochas, saber-vos minério!
Amar-te, Marte.
E regressar à folha onde escrevo e planto árvores, floresço nelas, refundo Roma,
recuneiformo escrita, rehieroglifo perfis, re-tróio Tróia,
retraio Páris e mato Heitor.

Delicado café cheio e o açucar ser dizer alto isto desde o princípio,
como um disparo em rajada contra o muro estúpido de ninguém saber disto.
Como é possível que ninguém saiba disto?
Eu devia ser tão Sinatra como o defunto,
ter o proveito e a fama.
Depois fugir, escorrendo pelos corredores, pelos bastidores, só para evitar o cansaço de autografar e ainda o maior cansaço de sorrir, quando o que quero é cama e desaparecimento anónimo entre quatro paredes e alguma música.
A fama é mel também.
O recato é ouro.
Pudesse eu reter a cor âmbar da paz doce, áurea,
e à fama dispensá-la só depois de tida.

Quero ilhas,
Santa Helena de ter sido general
e ter sido tudo,
incluído o império, incluído o exílio!

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