AUTÓPSIA AO SOARISMO II

«Há anos atrás, conheci em Washington um jovem economista de reconhecido talento que fazia parte da equipa do presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan. Naquela época, o chamado fenómeno dos yuppies atravessavaa sua fase douradae David Stockman, com trinta e quatro anos de idade, era já apontado como um dos jovens políticos mais promissores do seu país. Com apenas vinte e oito anos, tinha sido pela primeira vez eleito congressista pelo estado de Michigan. O presidente nomeara-o director de «Management and Budget», o equivalente a ministro do Planeamento. Tinha o futuro à sua frente. Quatro anos depois, desiludido com a hipocrisia e o tráfico de influências que caracterizavam a vida política, a todos surpreenderia abandonando-a para escrever O Triunfo da Política. Ê um livro surpreendente, que revela a falta de transparência da vida político-partidária e acusa o parasitismo daqueles que passam a vida a apregoar que estão na política por patriotismo e com sacrifício pessoal, pois poderiam estar muito melhor se se tivessem dedicado a actividades do sector privado - mesmo quando se sabe que, antes de entrarem na política, não tinham obra nem dinheiro. Num país em que as autoridades, os media e o público exercem um controlo rigoroso sobre o rendimento e financiamento dos políticos e sobre as suas actividades políticas e privadas, como é o caso dos Estados Unidos, que se regem por códigos de transparência acima de qualquer suspeita, David Stockman revelou a subtileza de meios que, mesmo assim, permitem o compadrio e o tráfico de influências no dia a dia da política americana. Em Portugal, neste pequeno país periférico, diminuído pela indigência e obscurecido pela opacidade, ensaia-se um sistema político-partidário moldado pelo Partido Socialista, onde só duas décadas após o restabelecimento da democracia se começa a discutir o tráfico de influências, a transparência e, enfim, o cidadão. Discussão envolvida em tanta hipocrisia e por métodos tão falaciosos que poderemos considerar que o nosso país, neste capítulo, se encontra num espaço cultural de transição entre o fascismo e um «estado de juízes», que não vislumbra um regime de verdadeiro controlo e legitimação democrática das instituições.» Rui Mateus

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